Eu vim pra bem longe – e isso é fato. E mesmo com toda a tecnologia existente para amenizar a saudade, as pessoas ainda me perguntam qual é o motivo de eu ter vindo e quando eu volto. Volta e meia essa pergunta é tipo um soco no estômago, volta e meia eu respondo no modo “não cuida da minha vida”. E volta e sempre eu falo a verdade. Mas a realidade é que eu vim pra bem longe procurar algo que eu não sei o que é. Ou se é aqui que encontrarei. Ou se um dia encontrarei.

Tem dias que é uma angústia que só. Tem dias que passam e eu quase não sinto. Tem dias que o Netflix ou a cerveja barata no bar são suficientes… O ponto é que nenhum dia é igual, mas a minha busca é sempre a mesma. Eu sei que é algo totalmente meu, ora faz sentido ora não. É raro algum momento em que eu compartilho esse nó dentro de mim, mas quando o faço, o nó afrouxa um pouco. E essa coisa minha, busca pelo impossível ou seja lá como você queira chamar, me aciona de um jeito diferente a cada dia.

Volta e meia eu tento organizar tudo, pra ver se tudo organizado em caixas ajuda a ver e a respirar melhor – o que eu não sei fazer assim tão bem. Volta e sempre eu me pego imaginando o dia em que eu respirarei quase naturalmente e verei as coisas de uma melhor forma – talvez mais madura e nítida.

Não, eu não me pressiono em busca de uma felicidade ilusória, eu realmente sou feliz da minha maneira. Se todo esse amargor faz parte da minha felicidade? Não sei. Dá trabalho separar todos os sentimentos e colocar numa balança pra ver se o resultado final é bom ou ruim. E não acho que seja humanamente possível. Acredito que temos que saber levar o negativo e o positivo na devida proporção – e isso também é trabalho pra meio século e mais muitas viagens.

Eu vim para bem longe procurar algo que eu não sei o que é

Eu não sinto um vazio em mim e também não me sinto deprimida. É só amargor de alguém que sempre se defende da vida e não sabe como parar. E isso é triste se considerarmos a minha idade. Mas eu sou colecionadora de tantas coisas, boas e ruins, que não inventaram balança pra pesar. Então quem sou eu pra me preocupar em pesar tudo isso que tem em mim? Não quero brincar de Deus, não quero reconstruir o que tá lindo, formado e funcionando. Quero saber lidar com o que já existe.

Todos temos uma trajetória que nos faz ser o que somos. Desastres e frivolidades todos seres humanos carregam. E cada um suporta o que for necessário suportar. Se meu desastre é maior que teu? Se a minha dor é maior que a tua? Quem sou eu pra te falar? O que eu posso te dizer é que eu entendo a tua dor exatamente por isso, porque dói em mim também. E acho mesmo que precisamos parar de competir e medir dores. Só assim vamos conseguir juntar esforços e amenizar um pouco do sofrimento existente. São tantos, não é?

E se eu puder te falar uma coisa, não se preocupe pra onde você está indo ou como a vida está te tratando. Você pode estar como eu, procurando amenizar tantos dragões dentro de ti, que quase nem vê a vida passar. Não vale nem meia lágrima o que passou, e eu sei o quão hipócrita eu pareci agora. Mas lembra que combinamos de ajudarmos uns aos outros? Essa sou eu, quebrada e remendada, te aconselhando a seguir, mesmo sem saber pra onde.

Eu sinceramente não sei se eu sou quem eu quero ser, e talvez seja essa toda a minha angústia. De qualquer forma, sigo procurando sem culpa o que eu não faço ideia do que seja, até eu me aquietar. E sigo vivendo sem remorso algum, mesmo que eu esteja perdida. Não é falta de foco, ocupação ou alegria. A vida vai bem. Só que volta e meia a gente para pra pensar e repensar em como chegamos, onde estamos e como nos tornamos o que somos.  Então, é automático eu me questionar se eu sou quem eu quero ser ou se eu estou onde eu quero estar. E esse tipo de pergunta machuca mais do que me perguntar quando eu volto para o Brasil. Mas com certeza estou melhor aqui, obrigada.