Você me quebrou, sabia? E agora ficou toda essa bagunça pra eu resolver. Nem sei por onde começar. Tem pedaços meus espalhados pela casa junto com o seu perfume. Se eu ficar quieta ainda consigo ouvir o som da sua voz e o barulho do meu coração quebrando. Não faz sentido ajoelhar e me cortar com os meus próprios pedaços. E ainda assim, cá estou. Então me diz, onde você está se não aqui?

Agora preciso colar os pedaços e ver o que sobra. Não que eu tenha muita opção e não que depois de você exista muito lugar no mundo pra mim. Mas e se a cola não for suficiente pra segurar tantos remendos assim? Do que é feita essa maldita cola: mentiras ou mais ilusões? Eu estou reconstruindo o que você quebrou sem sua ajuda, como se a responsabilidade fosse somente minha. Ao menos você percebe a ironia, não?

Isso me faz lembrar de quando você quebrou um copo na casa dos meus pais na primeira vez que você foi lá. A gente ria enquanto limpava a bagunça. E aqui estou eu limpando a nossa bagunça de novo – mas sem achar graça. Quando foi que eu fiquei responsável pela nossa bagunça sozinha? E quando foi que paramos de rir? Talvez essa faxina seja a mais difícil de todas: me limpar de você.

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Você me quebrou, sabia? E agora, além de colar os meus pedaços, eu vou precisar limpar o que sobrou. Passar um pano e um multiuso pra tirar a sua camada de julgamento, críticas e palavras maldosas. Isso enfraquece a cola – isso enfraquece nós dois. Também vou precisar deixar ventilar pra secar, sabe? Ainda não decidi se vou deixar na varanda – onde a gente passou a maior parte do tempo juntos, ou perto de qualquer janela.

Isso me faz lembrar de quando a gente brincou de colagem na escola e você achou que tinha feito uma obra de arte. O problema nessa brincadeira é que precisamos esperar pra ver o resultado. E digamos que no dia seguinte a gente descobriu você não tinha jeito pra arte. Naquele dia rimos até chorar e no meio do seu riso você me disse que queria ouvir o som da minha gargalhada pra sempre.

É cômico isso, porque eu quase não lembro do som da minha própria gargalhada. Agora carrego comigo uma vaga lembrança de quem eu fui e não faço ideia se ainda tenho espaço pra ser quem eu quero ser. Logo eu, menina risonha e apaixonada pela vida. Você me quebrou, sabia? Logo você, menino que cumpre o que promete. Ao menos você percebe a ironia, não?