Esses dias uma amiga me perguntou se eu tinha visto a notícia do menino sírio que morreu na praia. E eu falei que não, porque sou dessas sensíveis demais. Então pedi pra ela me contar delicadamente o que tinha acontecido. Logo percebi que ela também não leu a matéria, somente o título. E mesmo assim, considerou como lido e entendido. Acho que hoje sofremos desse mal. Somos a sociedade do imediatismo. A sociedade conectada 7 dias na semana e 24 horas por dia, mas que curte sem ler, compartilha sem concordar e veste a camisa sem entender. Somos uma sociedade totalmente hipócrita, que compartilhou a notícia do menino sírio e se comoveu, sem nem entender o que está acontecendo.

É sério que somos assim? Sabemos como mudar para melhor, salvar os cachorros abandonados, ter uma barriga sarada em uma semana e criticar um governo do qual somos omissos. Sabemos tudo sobre o que acontece nas redes sociais, mas não entendemos o que acontece com a prefeitura da nossa cidade. Nos preocupamos tanto em participar e estarmos ativos digitalmente, que esquecemos de dar bom dia para o padeiro – mesmo que a gente faça check-in na padaria. Somos tão fúteis que curtimos uma foto no Instagram, mas não sabemos fazer um elogio pessoalmente para o amigo.

A sociedade conectada

Postamos tantas e tantas informações inúteis, que paramos de nos preocupar com o que realmente é válido. Será que a lei ainda é válida ou fazemos justiça publicando tudo virtualmente? Nos tornamos justiceiros online e alienados offline? Sinto que temos preguiça de ler, entender, questionar e opinar. Acredito que todos podemos acrescentar algo para alguém, mas estamos ocupados demais para isso. Ingressamos na faculdade para irmos às festas e nunca deixamos a vida de universitários passar, vamos a congressos porque a empresa paga, vivemos em um modo automático porque é mais fácil, nos contentamos do jeito que está porque fazer algo diferente dá trabalho.

Estamos deixando o nosso cérebro atrofiar cada vez que jogamos Candy Crush. Não temos energia para toda essa conectividade. Eu sei que você lembrou do meu aniversário porque o Facebook te notificou. Mas sabe, as coisas perdem um pouco a importância exatamente por isso. Um parabéns no nosso mural não significa nada hoje em dia. Temos preguiça de manter contato e queremos ficar conectados o tempo inteiro. Temos preguiça de nos doarmos um pouquinho para saber como o outro está, e queremos ver o que todo mundo postou. Temos preguiça de ficar online para a vida, porque precisamos checar as nossas notificações. Achamos bonitas fotos de natureza no Instagram com a hashtag #nature mas não olhamos pra outro lugar, se não a tela, quando estamos na rua, na praia, na fazenda ou numa casinha de sapê.

Queremos acompanhar em tempo real o que não precisamos com o tempo que não temos. 

As coisas perdem a graça se a gente não compartilha, eu sei. Então vai para o bar e conta para os amigos o que aconteceu, o que você pensa sobre a Dilma, o que você entendeu do livro que leu, o que rolou na festa e como foi sua viagem. Construam diálogos inteligentes, sejam decentes e ajudem ao próximo sem nada em troca – sem qualquer registro, foto ou vídeo. Usem mais a sua própria memória do que a memória do celular.

Vamos fazer mais bilhetes no guardanapo pra avisar que chegaremos tarde ou que tem comida na geladeira? Vamos ligar para a pessoa e ouvir a voz dela. Quem não se encanta com pessoas que atendem o telefone sorrindo? Não conhecemos mais a letras das pessoas e nem as suas casas. Vamos voltar a assistir filmes juntos? Eu levo a pipoca e você a Coca-cola. Vamos nos ver e nos abraçarmos mais. Existe conexão melhor do que essa?

Nunca antes visto na história da humanidade uma sociedade tão hipócrita quanto a nossa. Só conseguimos ser felizes nas redes sociais porque no dia a dia não dá tempo, não tá bom, ta chovendo, estamos sem maquilagem e sóbrios. Vivemos uma vida falsa para conseguirmos postar e nos sentirmos pertencentes a esse circo deprimente. Quando o assunto é offline, não temos tempo e somos tão frustrados com nós mesmos porque não sabemos pra onde estamos indo.

Vivo em um mundo onde o digital está caracterizando o que será o futuro. E eu não gosto do que vejo. Vivo em um mundo onde vivemos para termos o que postar e ganharmos curtidas, e isso é mais do que triste. Vivo em um mundo que não se olha nos olhos, mas que se sabe como salvar a humanidade: é só compartilhar ideias, notícias e memes mal lidos e esperar que algo aconteça. Uma pena que ninguém compartilhou nada antes do menino sírio morrer não é?